quarta-feira, 7 de março de 2012
Repressão a estudantes no Chile ressuscita a tortura, denunciam entidades
A polícia chilena está no olho do furacão. Durante o ano passado, os estudantes sofreram na carne seu excesso de força. Muitos jovens denunciaram detenções ilegais, arbitrarias e até tortura nos quartéis policiais, o que fez piorar ainda mais a relação entre a sociedade civil e os Carabineros em matéria de respeito aos Direitos Humanos em democracia.
No início deste ano, os advogados da Organização Não Governamental “Assessoria Cidadã” expuseram diante da Comissão Interamericana de Direitos Humanos um levantamento com 117 casos de abusos policiais, cometidos pelos Carabineros nas mobilizações estudantis de 2011.
Mesmo assim os abusos continuam. Este ano também ocorreram violações aos direitos humanos dos estudantes. No dia 19 de janeiro passado, um menor foi torturado por carabineros em um quartel policial de Santiago após ser detido em um protesto estudantil. “Foi um menino de 17 anos que passou por um momento horrível. Enfiaram sua cabeça na privada e o golpearam, entre oito, dentro de um banheiro. Houve um carabinero que baixou as calças, ameaçador. É um caso que esperamos que vá para a Justiça. Depende da família”, diz Marta Cisternas, observadora de Direitos Humanos.
A tortura, como um fenômeno sistemático desde que começaram as marchas dos jovens chilenos em 2011, foi denunciada à imprensa internacional pela atual vice-presidenta da Federação de Estudantes do Chile, Camila Vallejo: “Isto não ocorreu porque um carabinero teve vontade ou porque teve um descontrole, mas é recorrente em todas as manifestações e isso tem relação com uma política que está por trás. Queremos saber se há carta branca para que façam o que queiram ou vem ordens para cada manifestação”, sustentou.
As principais denúncias dos estudantes contra a ação dos Carabineros são por dissolução de protestos pacíficos, detenções ilegais, violação de garantias dos detidos além de casos de ameaças e tratos vexatórios e inclusive os chamados de “coerção ilegal” dos privados de liberdade, o que corresponde a casos de tortura.
Nicolás Facuse, membro da ONG “Assessoria Cidadã” observa que denunciaram estes fatos à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, devido a existência do Decreto Supremo 1086, que limita o direito a manifestação e à liberdade pública: “O decreto supremo é tão vergonhoso para uma sociedade democrática, que quando se pede autorização para uma manifestação, tem que apontar quem usará a palavra no ato público. As forças da ordem têm a faculdade de acabar com uma manifestação se não se respeita a ordem de oradores estipulada”, afirma.
Amaro Oróstica, membro da equipe jurídica do programa de “Assessoria Cidadã” observa que existem cinco pontos que atualmente violam os Direitos Humanos no Chile:
- Em primeiro lugar a "repressão policial abusiva que sofreu o movimento estudantil nos últimos quatro meses, dos quais temos 117 casos registrados, entre eles 40 que inclusive podem ser qualificados como tortura".
- Em segundo lugar, "existe uma regulamentação legal que atenta contra os direitos humanos, tais como a liberdade de reunião e manifestação".
- Em terceiro lugar, "também há um problema com a formação dos Carabineros que não se condiz com os padrões democráticos do que se esperaria da formação de Carabineros de um país democrático".
- Em quarto lugar, "temos um problema com a justiça militar".
- Em quinto lugar, “há um processo de criminalização do movimento estudantil como, por exemplo, o projeto de “lei anti ocupações” que proíbe com duras penas as mobilizações civis”.
Outro problema entre estudantes e a polícia chilena se verificou em janeiro passado, quando nas duas últimas manifestações públicas com participação de jovens estudantes que se realizou no sector da Universidade de Santiago (USACH), se produziram uma série de irregularidades na atuação dos Carabineros, segundo observadores de direitos humanos, mais conhecidos como "boinas brancas".
Na primeira manifestação do ano, no dia 19 de janeiro, funcionários dos Carabineros teriam utilizado um novo gás para dispersar os manifestantes. Nessa ocasião, através do Facebook, muitos jovens divulgaram com fotos o que havia acontecido.
“Nós perguntamos pelo Facebook quais são os efeitos disto e o que os jovens responderam foi que se sentiram muito tontos, que a sensação era de tontura e de dor na pele e muita desorientação. Eu estava ao lado de três carabineros. Um deles levava o tanque nas costas, com dois tubos, como um lança-chamas, mas que lança um gás concentrado branco, cinza e amarelo”, comentou Marta Cisternas.
Esta semana começaram as aulas para os estudantes secundários. Muitos deles ficaram sem matrículas por que as autoridades das comunas onde mais houve protestos decidiram não renovar-lhes o direito de estudar. Vários jovens se acorrentaram nas portas dos colégios para pedir que sejam reintegrados. A imagem pareceu lembrar alguns fatos de protestos ocorridos em plena ditadura de Pinochet.
Os estudantes foram desalojados de maneira tranquila e estão à espera de uma resolução por parte do Ministério da Educação. Entretanto, este fato antecipa um novo ano de duras manifestações e protestos por parte da população, que continua demonstrando seu descontentamento com o governo de Sebastião Piñera e o acionar da força pública.
Fonte: Carta Maior
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