O artigo “Inclusão na escola, um relato pessoal”, publicado no jornal Folha de S.Paulo (28/3), e redigido por Maria Gabriela Menezes de Oliveira, mãe de um adolescente portador de uma síndrome que afeta seu desenvolvimento (síndrome de Asperger), toca em questões válidas não apenas para os estudantes com necessidades educativas especiais.
A primeira delas é o (mau) uso do ENEM e, de maneira geral, de todos os exames, como fator de exclusão de estudantes. A verdade é que esses exames não foram feitos para estabelecer rankeamento entre escolas, mas apenas para identificar situações que requeiram atenção e, consequentemente, investimentos específicos.
O problema é que foi apropriado, sobretudo pela iniciativa privada, como elemento de marketing, visando ampliar seus lucros. Então, exibir uma boa nota significa poder cobrar mais pelas mensalidades – um jeito de seduzir pais e mães preocupados com o futuro dos filhos.
Nas redes públicas, os governantes não têm utilizado esses exames para adequar investimentos. O óbvio seria, a partir da avaliação, formular estratégias que permitissem a estudantes e professores acessarem, respectivamente, o direito de aprender e ensinar.
A ideia central é que cada estudante acesse os conteúdos de acordo com suas potencialidades, que variam, porque as pessoas são diferentes, e não há nada de errado com isso. Não significaria, necessariamente, falta de qualidade na educação.
Então chegamos à segunda questão, essencial ao debate: o que significa qualidade na educação. Obviamente as escolas têm, entre suas atribuições, estimular os estudantes a desenvolverem algumas habilidades técnicas, mas não é apenas isso. Esperamos que nossas escolas também possam formar pessoas aptas a conviver socialmente de maneira digna, o que pressupõe conhecerem e saberem reivindicar de maneira pacífica seus direitos e, consequentemente, respeitar os direitos alheios.
Nesse sentido, a convivência com a diversidade é fundamental. Isso vale para todas as crianças, com necessidades especiais de aprendizagem ou não.
A autora encerra dizendo não saber a resposta para fazer valer o direito constitucional à educação, por ser “apenas mãe”. Eu discordo. Os governantes e legisladores só construirão ações públicas que levem à efetivação do direito universal à educação toda a sociedade discutir e aprovar qual é a qualidade social da educação que o Brasil deve ter. Que valores nossas escolas devem transmitir? Para que devem servir as habilidades técnicas desenvolvidas? Para que servem os sistemas de avaliação? E tantas outras questões esquecidas no debate atual, pautado pelo rankeamento.
Mas, este debate só é possível quando se considera a educação um direito, e não uma mercadoria. Por enquanto, o mercado da educação está levando a melhor, ao se apoderar dos exames para ampliar seus lucros. É hora de virar o jogo. E, para isso, precisamos de representantes de todos os segmentos sociais, em espaços institucionais, para debater a educação, notadamente, reorganizando o Conselho Estadual de Educação, também este atualmente apropriado indevidamente pela iniciativa privada.
*Geraldo Cruz foi prefeito de Embu das Artes e é atual deputado estadual pelo PT-SP
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