quarta-feira, 18 de maio de 2011

ENTREVISTA - Paulo Cesário Junior - (Coordenador da Comissão de Direito Político e Eleitoral da OAB de Osasco

“O voto distrital é uma situação que me preocupa muito. Dependendo da forma de como isso será feito, você pode beneficiar algum entendimento ou partido”


Graciela Zabotto
(gracielazabotto@webdiario.com.br)

Paulo Cesário é o coordenador da Comissão de Direito Político e Eleitoral da OAB de Osasco. Na semana passada, ele esteve presente ao debate sobre os principais temas abordados pela reforma política, realizado na Associação Comercial e Empresarial de Osasco (ACEO). Nesta entrevista, Cesário discorre sobre o fim das coligações, lista fechada pré-ordenada e financiamento público de campanha. Além disso, também aborda constitucionalidade da Lei Ficha Limpa.


Há dúvidas que a reforma política possa ser aplicada na eleição de 2012 ou apenas em 2014. Como o senhor avalia esse tempo para ser aplicada?

Já houve um grande avanço porque essa questão está sendo extremamente debatida, porém, infelizmente, esse debate ainda está muito na elite e preso aos estudiosos. Se a gente não conseguir colocar para que a população tome conhecimento da reforma política, isso não vai sair tão rápido. O que entendemos, nesse momento, é que existe um ponto passivo entre os partidos e é, justamente, a questão do fim das coligações. Há um ministro que defende o fim do financiamento das pessoas jurídicas, porém, mantendo a doação das pessoas físicas, e isso também seria um avanço. Acredito que não há um consenso, ainda mais em relação à lista fechada e pré-ordenada. O voto distrital é uma situação que me preocupa muito. Uma vez que você não sabe como será feita essa divisão do voto distrital. Como os estados ou municípios serão divididos? Dependendo da forma de como isso será feito, você pode beneficiar algum entendimento ou partido.

Como o senhor avalia a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a vaga do suplente pertencer à coligação e não ao partido?

Acho que essa decisão foi muito boa. Se for analisar a questão partidária, no momento das eleições, pelo menos no período de quatro meses, o partido político perde sua personalidade jurídica e é criada a coligação, como se fosse um terceiro partido. No caso da eleição, o suplente colaborou dentro do coeficiente eleitoral para aquele partido alcançar uma cadeira, nesse sentido acho que o Tribunal acertou.

Existem alguns questionamentos sobre a constitucionalidade da Lei Ficha Limpa. O senhor acredita que ela possa ser considerada inconstitucional pelo STF?

Por mais que a questão da Ficha Limpa tenha sido inicialmente uma medida mais popular, eu acredito que existem alguns dispositivos inconstitucionais em relação à questão do trânsito em julgado, quando a decisão não cabe mais recursos. Nesse sentido temos que respeitar, porque, se você deixa de concorrer a um cargo eletivo devido a ficha limpa, o que isso vai gerar? E sempre temos que lembrar que a Constituição define a soberania popular. É o povo quem define seus governantes e não podemos nunca passar por cima disso.

Quais são os pontos da reforma política que o senhor defende?

Primeiro a inquestionável questão do fim das coligações, acho que não cabe coligação no atual sistema que temos hoje. A questão da lista fechada pré-ordenada ainda causa algumas dúvidas, um exemplo disso é o comentário de Gomes Canutilho, um grande constitucionalista português. Em seu livro Direito Constitucional ele deixa muito claro isso. Apesar dele entender que não há uma inconstitucionalidade na questão da lista fechada pré-ordenada, 50% implica inconstitucional. Em nosso atual sistema brasileiro, a população ainda não vota em partido, a população vota em pessoa, no vizinho, no amigo, mas não vota nem um projeto partidário e político, vota pela afinidade que tem com a pessoa. Nós não temos ainda essa cultura e não adianta querer impor essa cultura de cima para baixo. Nós temos que tentar conscientizar a população que, mais importante do que votar em uma pessoa é votar em um projeto político. Esse trabalho de conscientização é que deve permanecer, não impor a questão da lista aberta ou lista fechada.

E quanto ao financiamento público de campanha?

O financiamento público de campanha deve ser muito mais debatido. Caso mude a questão da lista fechada, o financiamento público só é viável em uma lista fechada pré-ordenada por que como será feita a distribuição entre os partidos se não houver uma lista pré-ordenada? Quem vai receber mais ou menos recursos? Isso gera uma dificuldade muito grande. Tanto é que hoje já temos uma distorção com o fundo partidário, que é destinado ao diretório nacional, aos diretórios estaduais, mas nunca chega aos municipais. Então se o próprio corpo diretivo do diretório municipal não tomar a frente, a máquina não gira nos partidos. Essa questão do financiamento público de campanha ainda traz muita dúvida. Sem falar que já temos financiamento público. Aquelas propagandas gratuitas não são bem gratuitas, essas propagandas têm a questão do imposto, quando as emissoras acabam tendo isenção, e isso é muito complicado. Toda reforma vai gerar problemas processuais, por exemplo, se há uma lista pré-ordenada e um dos membros que está no 1º ou 2º lugar tem algum problema jurídico, quando for impugnar, será impugnado o candidato ou a lista? O Supremo já definiu que a chapa de prefeito é insolúvel, então, como seria? Seria criada nova jurisprudência, um novo entendimento e iria gerar muita discussão em torno disso.

Como o senhor avalia a aprovação da união estável homossexual pelo STF?

Eu avalio como um grande avanço. Acho que o Congresso Nacional perdeu o time e acabou demorando para fazer uma aprovação como essa. Constitucionalmente falando, acho que seria imprescindível em relação a isso.

O senhor acredita que essa decisão pode impulsionar a aprovação da criminalização da homofobia pelo Congresso?

Ainda não tenho essa visão. Porque, de qualquer forma, a criminalização da violência já existe. Então não sei se vai ser [aprovada] com tanta rapidez.

E a aprovação do casamento entre homossexuais?

Pode acontecer. Mas, de qualquer forma, eu acho que não. Na realidade, pelo o que temos conhecimento até agora, e até mesmo pela questão cultural, o casamento ainda é entre homem e mulher. Mas acho que só a questão do reconhecimento da união estável entre homossexuais já foi um grande avanço.

A bancada religiosa da Câmara basicamente utiliza argumentos de acordo com cada crença para se opor aos direitos homossexuais. O senhor concorda que a religião e não a justiça acabe interferindo em decisões como essa?

Nós sempre temos que ter uma ressalva quando se fala em democracia porque todos temos o direito de opinar e ter suas convicções. A questão da igreja é uma oposição talvez mais arcaica. Mas já houve alguns avanços dentro da própria religião, porém, ela demora muito tempo para tomar uma postura e sabemos que a cultura muda de tempo em tempo a questão social e o entendimento das pessoas. Nesse sentido, temos que tomar muito cuidado quando se fala de posicionamento de opinião.

Atualmente, o judiciário tem aprovado diversas resoluções sobre o sistema político brasileiro e alguns deputados têm afirmado que há interferência constante da Justiça nas questões que competem ao Congresso. Como o senhor analisa essa situação?

Primeiro que existe na questão constitucional e também no Código Eleitoral um dispositivo que possibilita ao Tribunal emanar normas, o que não pode acontecer, como aconteceu em algumas situações passadas, é ele [Tribunal] criarem situações de condições de inelegibilidade, isso o Tribunal não pode fazer, o que ele tem que fazer é organizar a Justiça.

Uma reforma política pode resolver esse impasse?

Não tenho essa certeza.


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